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segunda-feira, 16 de maio de 2022
A PARTIDA DO CINEASTA DE ZEZÉ DI CAMARGO & LUCIANO
Neste
último sábado, dia 14 de Maio de 2022, o cinema brasileiro sofreu a perda
repentina do diretor Breno Silveira, que faleceu com 58 anos.
“Ele
estava rodando cenas do filme inédito "Dona Vitória", estrelado por
Fernanda Montenegro, na cidade de Limoneiro, em Pernambuco, e teve um infarto
fulminante.
O diretor
começou a passar mal no set, com taquicardia. A equipe do filme estava na
região para rodar as cenas da infância da personagem-título. A informação foi
confirmada por uma pessoa da equipe de filmagem. Os atores estão em choque e
tentam providenciar o translado do corpo para o Rio de Janeiro.
Breno
Silveira havia contraído Covid-19 no dia de 3 de maio, quando as filmagens
precisaram ser interrompidas. A equipe havia retomado o trabalho há poucos
dias. Breno Silveira teve o infarto fulminante enquanto acompanhava uma cena
ser rodada. Ele
morreu
sentado, em frente ao monitor do set. Este era o primeiro dia da equipe em
Pernambuco.
O filme
"Dona Vitória", que o cineasta estava começando a rodar, é baseado na
história de uma mulher que desmontou uma quadrilha carioca de traficantes e
policiais a partir de filmagens feitas da janela do seu prédio, no bairro de
Copacabana, do Rio de Janeiro. Sua história foi contada por meio de uma série
de reportagens do jornal "Extra", de autoria do jornalista Fábio
Gusmão, e que depois também virou livro.”
Via Bruno
Oliveira.
Naquele
mesmo dia, dei uma conferida na minha
Smart Tv ao filme que ele dirigiu, do
qual ele é mais lembrado e isso foi bastante divulgado nas notícias dos sites
que é 2 Filhos de Franciso(Brasil,
2005), ainda mais por este ter sido o filme que mais arrecadou nas bilheterias brasileiras
na época do seu lançamento.
Na
primeira vez que eu assisti ao filme, não na telona, mas pouco tempo
depois quando foi lançado em DVD e confesso que me surpreendi com a abordagem tocante com que o diretor
abordou no filme sobre a trajetória da famosa dupla sertaneja Zezé Di Camargo
& Luciano, e revisitando pude perceber como ele envelheceu bem, pelo fato
de justamente tratar do tema universal sobre os valores familiares do ser
humano.
Essa
obra marcou a estreia de Silveira na direção de titular, depois de ter adquirido um bom currículo trabalhando na
função de diretor de fotografia em filmes como Carlota Joaquina-A Rainha
do Brasil(Brasil, 1995), filme que marcou o pontapé inicial da retomada
da produção nacional de cinema.
Silveira
teve um desafio e tanto de ao estrear na direção, apostar em produzir um drama biográfico sobre a mais popular dupla
sertaneja, artistas que por anos figuraram entre os mais vendáveis da indústria
fonográfica brasileira e pelo que o próprio confessou que apesar de ser apaixonado por música, e até
trabalhou na direção de videoclipes de importantes cantores brasileiros. O
estilo musical da dupla não era da sua preferência.
Com
roteiro escrito por Patrícia Andrade e Carolina Kotscho, Silveira tomou uma sabia
decisão de moldar o enredo não pela ótica de querer endeusar a dupla sertaneja
contando a história superficial deles no auge do sucesso, mostrando uma romantização
da glamourosa vida deles quando já famosos se apresentavam constantemente em programas de TV.
Aqui
nesse filme, Silveira optou por explorar a vida pregressa da dupla, tendo como
fio condutor o pai dos dois, Francisco
Camargo(Ângelo Antônio). O que se mostrou uma boa sacada da sua parte, pois explorou bem uma característica
que o diretor sempre prezou por explorar na estética das suas obras, que é mostrar
as relações humanas, principalmente na
base familiar. Algo que ele soube explorar
muito bem posteriormente quando dirigiu Gonzaga:
De Pai Pra Filho(Brasil, 2012), cinebiografia de Luiz
Gonzaga(1912-1989), o Rei do Baião e também na série Dom(Brasil,
2021) da Amazon Prime Vídeo sobre o traficante Pedro Dom(1981-2005).
A
trama aborda diferentes camadas sobre a trajetória da dupla, que começa na
premissa quando Seu Francisco(Ângelo Antônio) trabalhando como lavrador e sua
esposa Helena(Dira Paes) esperando a chegada
do primeiro filho Mirosmar, o primogênito que vai assinar futuramente
como Zezé Di Camargo, em Pirenópolis, no sertão de Goiás em 1962.
Ele
já mostrava um sonho quase que impossível e um tanto mirabolante, de
transformar dois de seus nove filhos numa dupla sertaneja. Ele tenta botar em
prática isso no seu primogênito e com o outro filho Emival(Marcos Henrique).
Ele presenteia Mirosmar(Dablio Moreira criança e Márcio Kielling adulto) com
uma sanfona. Onde ele mostra os seus dotes artísticos ao fazer pequenas
apresentações em feiras. Para eles conseguirem chegar ao topo de virar a mais
consagrada dupla sertaneja ganhando rios de dinheiro não ocorreu assim como num passe de mágicas da noite
para o dia. Passaram por muitas provas e desafios. Quando tentam se apresentarem num programa de
rádio Mirosmar e seu outro irmão Emival são chamados de Camargo &
Camarguinho, são zombados pelo radialista e pela plateia ao cantarem uma canção
exaltando a Ditadura Militar no Brasil. E o radialista os manda embora dizendo
para eles não cantarem aquela música
jamais na rádio, pelo medo dos militares
invadirem a rádio e a tirarem do ar.
A
vida modesta dele no campo irá mudar quando é mostrado ele brigando com seu
sogro Benedito(Lima Duarte) sobre o terreno, que faz ele tomar a decisão de se
mudar na capital e lá fincar raízes ajudando a sustentar os nove filhos como pedreiro numa construção civil,
onde o pouco que ganhava procurava manter um padrão de vida dos mais
confortáveis para ele, a esposa e os filhos. Enquanto Mirosmar e Emival não
desistem do sonho e tentam se apresentarem numa rodoviária, onde lá conhecem um
empresário chamado Miranda(José Dumont), que ao observá-los cantando se oferece
para agencia-los.
Esse
sugere uma modificação do nome da dupla, é durante o período da convivência
deles com este agenciador, que ocorre uma grande tragédia que ocorre num
acidente automobilístico quando Miranda estava retornando com os dois depois de
uma apresentação. Neste acidente Emival morre, e interrompe mais uma vez o
sonho de seu Francisco de transformar os filhos em artistas de sucesso.
Até
que com o passar do tempo, o filme vai
se adiantando em sua rodagem mostrando Mirosmar já adulto, fazendo suas
apresentações de sanfona em boates. Enquanto que seu irmão menor, Welson, que
após crescer formaria dupla com ele, assinando como Luciano.
É
lá que Welson(Wigor Lima criança e Thiago Mendonça adulto) resolve também se
mudar após a desilusão amorosa, resolve
construir sua vida lá em São Paulo, onde fica hospedado na casa de Mirosmar e
lá começam a difícil batalha de tentarem conseguirem irem atrás de uma gravadora,
com muitos percalços conseguem, gravam o primeiro LP, onde lá tem uma cena do
produtor explicando para Zezé, que ele só garante o disco, mas não garante o
sucesso. Botando um balde de água fria.
Nos
momentos finais, é mostrado eles voltando para Goiás, onde retornam à casa da
família e mostram-se muito desiludidos, quase desistindo, quando então
novamente Seu Francisco resolve reforçar
ligando num orelhão gastando suas fichas nas rádios para tocarem É O Amor,
convence muita gente que para alegria termina com eles ouvindo na rádio É O
Amor, liderando as paradas.
A
ideia do diretor concluir nesse ponto também mostrou uma ótima sacada sua de nesse
mote decidir concluir
a jornada de conquista deles conseguirem almejarem o tão sonhado sucesso
como uma linda mensagem de que nada é impossível mesmo que a vida fosse dura.
Optar
por não mostrar as consequências depois do sucesso de É O Amor eles
ganhando muito dinheiro e vivendo a vida
glamourosa poderia descaracterizar a
linha de raciocínio que a narrativa
estabeleceu de contar a trajetória pela ótica do pai deles. Fora que também
forçaria muito a barra de mostrar o momento doloroso que a dupla passou quando
outro irmão da dupla Wellington Camargo, que ficou paraplégico na infância ao contrair
uma poliomielite, cuja passagem é até mostrada
no filme, e que em 1998 este sofreu um
sequestro que durou longos dias e meses agonizantes de muita negociação com a polícia,
e ele só conseguiu ser libertado pelos sequestradores em março de 1999.
Portanto,
é compreensível essa opção que Silveira tomou ao dramatizar a história da dupla
com caráter mais humano pela base
familiar paternal deles que foi muito importante na formação deles não
só como artistas, mas também seres humanos.
Além
do enredo, outro aspecto que Silveira trabalhou perfeitamente no filme foi na
direção de arte e todo o design de produção impecáveis. Destaques para as
diferentes locações externas, como o cenário bucólico do sertão goiano de Sitio
Novo, passando pela zona suburbana da capital Goiânia e as locações de São
Paulo, onde em cada uma foram bem
trabalhadas na direção de fotografia diferentes paletas de cores, onde cada uma criava bem um
ambiente atmosférico, das cores mais quentes e estouradas ambientadas no sertão
goiano, para as cores mais saturadas e frias das zonas suburbanas.
Some-se
isso as caracterizações criveis dos
figurinos, onde cada um simboliza bem a
característica simplista de se vestir dos protagonistas que retratou cada época que a obra vai se ambientando. Do
jeito caracteristicamente matuto do
sertão, para o jeito mais suburbano da periferia da capital goiana e depois
durante a estadia paulista da dupla.
Esse toques vintages fez com que a obra fosse
bem trabalhada na estética kitsch. Fazendo o filme assumir ser propositalmente brega no bom sentido da
palavra.
Some-se
a isso também ao elenco estelar presente no filme, que contou em seu casting
com nomes célebres de novelas da Rede Globo como Ângelo Antônio na pele do pai
da dupla Francisco Camargo agindo com a típica figura do matuto com característica rústica. O ator mostrou um bom desempenho dele como
patriarca que sonhava alto em transformar os filhos em artistas. E que graças a
história do filme, o tornou famoso nacionalmente, ele que sempre procurou
prezar pelo anonimato depois que viu seus dois filhos estourarem, mas se tornou
uma respeitada figura pública depois que teve sua história contada no filme, é tanto
que quando ele faleceu em 2020 aos 83
anos, vítima de uma parada cardiorrespiratória sua morte gerou uma comoção
nacional e alguns atores que trabalhavam como o próprio Ângelo Antônio que o
representou manifestou sua mensagem de solidariedade a dupla pela perda do pai. Dira
Paes na pele da matriarca Helena, representou perfeitamente bem ela como contraponto ao marido, tentando
botá-lo com pés no chão no sonho mirabolante dele transformar os filhos em
artistas.
Márcio
Kielling, jovem ator egresso da novela teen Malhação, representou
bem o Zezé Di Camargo adulto num lindo trabalho de composição, principalmente
no seu figurino brega. Paloma Duarte ficou ótima como a Zilú, primeira esposa
do Zezé, muitos anos depois do lançamento desse filme eles separariam e
atualmente Zezé está casado com Graciele
Lacerda.
Thiago
Mendonça na pele do Luciano jovem imaturo, também se mostrou excelente, fora as
rápidas participações especiais de feras como Lima Duarte na pele do Seu
Benedito, avô durão da dupla. José Dummont como Miranda, o primeiro
agenciador da dupla antes formada por seu falecido irmão Emival. Jackson
Antunes mostrando seus dotes de sanfoneiro numa cena de apresentação numa
feira, Nathália Lage como Cleide, primeira namorada de Luciano com quem ele
irresponsavelmente engravidou. Assim como destacar as crianças escolhidas para protagonizar a dupla na infância como Dáblio Moreira ficou excelente na pele do Zezé
Di Camargo, Marcos Henrique como Emival representou brilhantemente e Wigor
Lima como Luciano também esteve incrível. Fora também o trabalho magnifico das
orientações fonoaudiológicas e das aulas de prosódia que o elenco teve para que eles pudessem incorporar com muita
verossimilhança a fonética do sotaque goiano seja no ambiente rural mostrado no
começo ou mesmo no ambiente suburbano da capital.
Enfim,
posso concluir que a maneira como Silveira tomou suas decisões foram bastante
certas, tirando um problema ou outro quanto ao ritmo arrastado da narrativa que ela mostra nos minutos finais quando
apresenta a dupla real visitando o antigo sitio que residiam. A dupla inclusive
no mesmo dia que se apresentavam em Curitiba/PR, ao saberem do falecimento do
diretor prestaram uma homenagem a ele cantando junto com a plateia as canções tocada
no filme. Mas no balanço geral, a obra traz uma abordagem bastante atemporal e
emocionante sobre os valores familiares, principalmente para estes tempos tão
conturbados ela merece ser vista e revista.
Que
Descanse em Paz,
Breno
Silveira.
(1964-2022).