sábado, 7 de novembro de 2020

ADEUS LOURO JOSÉ- O BONECO DO PROGRAMA DE CULINÁRIA MATINAL

 

UM BONECO FAZENDO SUCESSO  NUM PROGRAMA DE CULINÁRIA.

 

Na tarde do  domingo da véspera de finados, 1º de Novembro, partia para o plano espiritual Tom Veiga(1973-2020). O homem responsável por manipular e fazer a voz do famoso papagaio  Louro José, fantoche  que divertia o Brasil diariamente nas manhãs do programa Mais Você na Rede Globo. Ele tinha 47 anos e sofreu de um AVC hemorrágico em sua residência na Barra da Tijuca no Rio de Janeiro.




Essa notícia deixou o Brasil inteiro abalado e inconsolado, gerando muitas repercussões nas redes sociais de gente famosa  de um cara que nunca costumava dar as caras em público quando não estava no programa matinal manipulando e dando voz  ao famoso fantoche. Aliás ele nunca dava as caras em público, nem mesmo para dar entrevistas em outros programas de TV. Só mesmo quando postava suas fotos em rede sociais.




O fato curioso sobre este fantoche é que a ideia do personagem  não partiu  dele que o representava, mas sim da apresentadora Ana Maria Braga lá pela segunda metade da década de 1990, na época que ela apresentava um programa de culinária chamado Note e Anote na Rede Record TV entre os anos de 1993-1999.

Ela teve essa ideia quando estava num engarrafamento acompanhado do seu então marido e empresário Carlos Madrulha, e de lá começou a conversar sobre  a ideia de levar ao programa um fantoche para o seu programa para ela se interagir  como forma principalmente de atrair a criançada, já que como o programa começava lá para meio-dia, uma hora da tarde, hora posterior as atrações dos programas infantis Bill Body e Agente G,  nesta época onde ainda reinavam no horário matutino das grandes  emissoras abertas os programas infantis com seus faturamentos de anúncios publicitários e nessa hora ainda passava programas infantis passando desenhos em outros canais, ela usou desse artificio como forma de atrair as crianças acompanhadas das mãe donas de casa para segurar sua audiência.




Inicialmente antes dela definir e começar a rascunhar  o boneco  como papagaio ela pensou nele em ser um cachorro, um gato e outros animais, até definir como papagaio que ficaria mais verossímil já que a ave tem a habilidade de reproduzir a fala humana, como ela já tinha um papagaio de estimação que batizou de Louro José sendo o José em homenagem a seu pai, fez o mesmo com o fantoche, que foi confeccionado todo em espuma com a movimentação dos olhos e das asas  em animatronico por uma empresa da própria Ana Maria Braga,  já para dar voz ao boneco, ela pensou em ser alguém da própria produção mesmo, não queria que fosse um manipulador habilidoso, competente e profissional, porque queria algo mais verdadeiro, autentico. E é ai que ele entra na história, isto porque Neilton Veiga Junior, vulgo  Tom já trabalhava antes com ela desde 1995 atrás das câmeras  como seu assistente de palco. Função essa da qual ele entrou por mero acaso, já que ele nunca tinha trabalhado em TV. Já tinha sido  office-boy e motorista de ambulância até que quando ele estava trabalhando como feirante em artesanato, foi lá que  Ana Maria apareceu e o convidou para assumir a função de  assistente de palco, em seu  programa então na Record, já que além de culinária o programa também se focava no artesanato e ficou encarregado dele dar este suporte.





Tom havia relutado muito em aceitar o convite para manipular o boneco, Ana Maria insistiu já que ela como não queria que fosse um manipulador profissional, pois via que não ficaria muito natural, ela então  fez muitos testes com membros de sua própria produção, quando num dia ao observá-lo brincando com o boneco nos bastidores o convenceu a ficar na função.

E foi daí então que por esta insistência dela, ele acabou aceitando a função, ainda não muito a vontade de fazer a voz do boneco na frente das câmeras, e com perdão do trocadilho, ainda não tinha conseguido encontrar o tom certo para ele e foi se encontrando e aprimorando  com o passar do tempo. Que nesta época carregava um  aspecto feio, era todo mambembe, parecia feito de forma amadora, e depois que Ana Maria Braga saiu da Record em 1999 por divergências salariais com a direção executiva  e foi contratada pela Rede Globo para comandar o Mais Você que está no ar até hoje, e  levou junto com ela o fantoche e a partir daí foi que ele mudou a aparência, ficando  mais bonita e começou uma longa e duradora parceria de mais de 20 anos.





Eu lembro vagamente  da primeira vez que vi este fantoche aparecendo no programa Note e Anote, naquela época, segunda metade dos anos 1990,  eu era bem garotinho  e estava assistindo numa antena  parabólica que tinha sido recém-instalada lá na outra casa que eu morava que era na Rua dos Potiguares. Nesta época o sinal da Record ainda não pegava aqui em Natal-RN.




Confesso que assistia aquilo e minha irmã via junto  por acharmos  divertido e engraçado, principalmente a interação deles com as batalhas de pegadinhas, ainda que ficasse estranho ver  uma apresentadora de programa de culinária, cujo nicho de público é o feminino, interagindo com um fantoche, um objeto, um ser inanimado que atraia mais as crianças num programa daquele nível, que além do foco ser culinária também trazia abordagens sobre comportamento, moda, saúde, entretenimento,  etc...

Tudo isso voltado ao público feminino, num formato jornalístico que bem se encaixa na categoria  dos meios de comunicação  como uma imprensa rosa.






Depois de ler muitas matérias de sites  divulgando a sua  morte, com artigos até de opinião, me fez aqui chegar à  seguinte conclusão de  que se não fosse pela boa sintonia, a química, o entrosamento e  a conexão  que Ana Maria mostrava ao se interagir com o  fantoche na frente das câmeras por tanto tempo. Aquela sua  ideia ousada  poderia ter tudo para dar errado e fracassar. Imagino como a grande mídia impressa da época, dos jornais e revistas. Numa época em que a internet não era tão massificada quanto agora com as redes sociais. Pensava dessa maneira, que podia não ser duradouro a ponto de parecer muito ridículo uma apresentadora de um programa de temática feminina trazer um fantoche para se comunicar como uma  pessoa qualquer poderia parecer  não muito natural, poderia ficar bastante teatralizado ou mesmo muito caricato.  




E eles conseguiam convencer a naturalidade da interação, principalmente pela forma como Tom Veiga foi conseguindo moldar,   imprimir uma personalidade mais humanizada, a medida que foi se encontrando nele. Principalmente na maneira como ele ao incorporar e dar vida  ao fantoche desenvolvendo uma técnica de voz  de falsete, ajustando num timbre agudo personificava no papagaio um  perfil um tanto infantil, malandro, encrenqueiro, xavequeiro,  intempestivo, grosseiro, mal-educado de fala gritada, e muito tagarela,  que  enfim, tornava o  personagem divertido, que criava um ótimo contraponto com a Ana Maria, principalmente pelas rápidas tiradas  que Tom colocava com o Louro José  para causar uma quebra de clima, com ótimas sacadas de timming bem colocadas no improviso, com uns toques de duplo sentido e um tanto boca suja  que lhe dava um aspecto bem  anárquico e  transgressor. Tipo enquanto que ela mantinha uma postura séria no programa, principalmente quando tinha alguns convidados ou cometia umas gafes na hora cozinhar, ele aproveitava para soltar uma tirada cômica que ajudava a segura-la muitas de muitas situações constrangedoras que ela  passava no ar. Uma cumplicidade que também era fora do programa, pois, segundo a própria nunca lhe ocorreu deles viverem tretando nos bastidores.





Tom sempre optou pelo anonimato, mesmo com o fantoche que ele manipulava  sendo um grande fenômeno e sucesso  no Brasil inteiro. Uma sábia decisão, pois  caso ocorresse dele aparecer demais ocorreria uma grande quebra, a ponto de parecer que ele estava se autopromovendo, e se a fama começasse  a subir na sua cabeça e ele  caísse nas armadilhas que vem junto, quero nem pensar nas consequências negativas  que poderia ocorrer.





Inclusive num dos poucos registros que tem dele mostrando a cara limpa em público,  é dando  um depoimento no vídeo do webdoc do projeto  Memória Globo, onde ele ali explica a insegurança e timidez  inicial que sentia ao manipular o fantoche na frente das câmeras e do porque  do medo que sentia daquilo o tornar uma figura pública. O jeito como ele naturalmente fala,  nem parece que é o mesmo cara que dava voz ao papagaio.





De fato, dá para entender o motivo pelo qual a perda da pessoa que fazia a voz do famoso  papagaio das manhãs do Mais Você comoveu o Brasil inteiro. Mesmo ele não sendo um manipulador profissional, tinha umas boas sacadas muito rápidas para extrair o humor sem o roteiro, e por não ser roteirizado não transparecia ficar muito teatralizado. O que se fosse seguir dessa forma, poderia parecer ridículo e um tanto kitsch.




Essa formula deu tão certo que depois, outros programas não voltados para crianças, voltados para adultos com temáticas pesadas passaram a adotar a figura dos fantoches para promover diversão, alguns vingaram, outros não.




Um do melhores exemplos de fantoches que vingou além do Louro José, foi o Xaropinho, o rato  boca suja, manipulado por Eduardo Mascarenhas que também surgiu contemporâneo do papagaio nascido  também na Record no programa Ratinho Livre (1997-1998). Programa noturno exibido diariamente no horário  nobre, comando por Carlos Massa, mais popularmente conhecido pela alcunha de  Ratinho,   num formato bem caracteristicamente  popularesco  nada apropriado para crianças assistirem que apelava sem a mínima  cerimônia para a baixaria, vulgaridade, com toques de mundo cão, com situações bizarras, e esquisitas de tão  farsescos  que pareciam. Muito disso trazido do estilo policialesco com cassetete e agindo bem irascível, bronco, e sem educação que foi   herdado dos tempos em que Ratinho trabalhou apresentando o  programa 190 Urgente na TV Transamérica entre 1996-1997 com inspiração no estilo intempestivo e explosivo de Luiz Carlos Alborghetti(1945-2009), um dos  nomes  mais importantes,  ao mesmo tempo  polêmico e controverso  que já existiram no jornalismo policial brasileiro no qual Ratinho começou seu trabalho na TV com este apresentador no começo da década de 1990   quando apresentou o programa Cadeia  na TV OM( Atual CNT).

Assim como a exemplo de Ana Maria Braga, quando Ratinho se mudou para o SBT em 1998, para comandar o seu Programa do Ratinho, ele também levou junto o Xaropinho e este também permaneceu fazendo sucesso até os dias hoje.

Enfim, só o que posso concluir é que dificilmente existirá outro bom manipulador do fantoche Louro José que  conseguirá substituir Tom Veiga para chegar no mesmo patamar de perspicácia e de sagacidade com que Tom conseguia ao  imprimir na personalidade do papagaio usando de  uns toques de malandragem e transgressão para deixa-lo mais humanizado sem parecer ridículo que convencia que ele tinha vida mesmo.




Em pensar que antes do baque  dessa trágica perda irreparável do cara que manipulava o fantoche com quem  ela mantinha uma relação maternal  nos bastidores, que era como se fosse um terceiro filho postiço dela. Ela quase sofreu a perda do fantoche em alguns episódios que envolveram batalhas judiciais. Como o processo movido pela Disney que a acusou de plágio por achar o fantoche do Louro José muito parecido com Zé Carioca. Pior mesmo foi o processo movido por dois artistas que trabalharam na confecção do boneco exigindo os direitos de registro e da imagem. Batalha esta que durou anos.

Enfim, de uma coisa pode-se garantir, com a morte de Tom e sem o Louro José, Ana Maria Braga terá o percurso difícil desafio  de comandar as manhãs do Mais Você sem a presença dele e a sensação não será mais a mesma para o público vai ficar um grande vazio.

 

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