Assistindo
no YouTube pela conta Cine Antiqua ao Nosferatu clássico de 1922 no
final de Dezembro de 2024, para entrar no clima da estreia do novo Nosferatu,
produção da A24, dirigida por Robert Eggers.
Para
compreender melhor o que levou a esse marcante filme entrar para a história do cinema de terror ter sido concebido na década de 1920 e se tornou o
clássico primeiro registro de uma adaptação não-oficial do Drácula.
Vamos
compreender primeiramente o contexto, o diretor alemão Friedrich Wilhelm Murnau que assinava como
F.W.Murnau(1888-1931) queria adaptar o romance Drácula, que o romancista
e contista irlandês Bram Stoker(1847-1912) havia publicado em 1897.
A
inspiração para Stoker criar esse romance foi com as lendas do real Conde
Drácula que não foi um vampiro.
Foi
na verdade um Príncipe da Valáquia
durante o século 15, nascido na Transilvânia, região que existe até hoje e lá
fica localizado na Romênia e lá existe de verdade o Castelo do Conde Drácula onde é
ponto turístico.
Vlad
Tepes III Dracul(1431-1476) como foi
batizado o verdadeiro Drácula que originou a lenda do Drácula Vampiro da
mitologia da cultura pop, recebeu esta denominação de Drácula, em referência a
seu pai Vlad Dracul, cujo nome na extinta língua latina significa “dragão”, no
povoado local ele era de Vlad Draculea, (Vlad Filho do Dragão), em referência a
“Ordem do Dragão” uma importante irmandade religiosa surgida naquela
região no começo do século 15 do qual ele tinha um forte vínculo
sagrado.
Vlad
III era um homem que reinou na Transilvânia em períodos de tempos bem diversos,
no primeiro momento assumiu o trono em 1448, onde passou apenas um ano, em
seguida voltaria ao trono em 1456 onde governaria por seis anos e no último
momento foi em 1476 quando morreu durante uma batalha contra os turcos, estava
na época com 45 anos de idade.
O
legado que foi passado ao longo dos séculos sobre a importância do Conde
Drácula para o povo romeno foi da figura arquetípica de um herói defensor de
seu reinado contra a invasão turca.
A
maneira como o verdadeiro Drácula praticava a execução de seus adversários na
guerra, de uma maneira um tanto quanto cruel empalando as vítimas
principalmente nos turcos, uma técnica de execução “que consiste em atravessar
uma lança pelo corpo da vítima, de cima para baixo”* isto o tornaria célebre
como Vlad, O Empalador.
Esta
sua má fama perdurou mundialmente por vários séculos, ainda mais quando no
final do século 19, um célebre escritor irlandês de romances, contos e poesia
chamado Abraham “Bram” Stoker inspirado nesta lenda do real Conde Drácula, o
eternizou com um elemento sobrenatural do vampirismo na sua famosa obra de
ficção com ares góticos que refletia a influência do movimento literário que a
Europa vivia com o romantismo que exaltava uma visão nostálgica de uma Europa
Pré-Revolução Industrial quando vivia uma vida mais bucolicamente campestre,
trazendo aquele toque de lirismo poético, movimento esse que exaltou também a
monarquia com os contos de fadas.
Este
romance de Stoker seria na posteridade com o advento do cinema no início do
século 20, responsável por eternizar a figura arquetípica mitológica do Drácula
como vampiro.
É
o primeiro registro de filme a surgir inspirado no romance de Stoker foi o Nosferatu-Uma
Sinfonia de Horror(Nosferatu, Alemanha, 1922), que é o foco do texto.
“No
início da década de 1920, a Prana Film, produtora alemã, iniciou suas
atividades no país. Albin Grau, que pretendia realizar diversos filmes
centrados em temas do sobrenatural e do oculto, assinou a produção do primeiro
projeto do estúdio, intitulado inicialmente como “Drácula”. Dirigido por F.W.
Murnau, o longa pretendia adaptar o famoso romance do escritor irlandês Bram
Stoker, o maior ícone da literatura vampiresca mundial.
À
época, Bram Stoker havia falecido há poucos anos, mais precisamente em 1912.
Desde então, a viúva do autor, Florence Stoker, detinha os direitos sobre a
obra do marido, e não os cedeu à Prana Film, impossibilitando que a produtora
retratasse a história nas telas legalmente.
Determinado
a produzir o filme, incentivado por lendas locais de mortos-vivos que escutou
ao servir o exército durante a Primeira Guerra Mundial, Albin Grau(1884-1971)
sugeriu diversas mudanças ao roteirista Henrik Galeen(1881-1949), para que a
inspiração na obra de Bram Stoker se tornasse menos evidente.”
Murnau não tinha conseguido
adquirir o direito de adaptação, por isso mesmo, tanto o título quanto o
protagonista tiveram os nomes alterados,
o título Drácula foi alterado para
Nosferatu que é uma palavra de origem húngaro-românica que
significa "vampiro". A palavra se popularizou no final do
século XIX e início do século XX, principalmente devido à ficção ocidental,
como o romance Drácula(1897) e o filme Nosferatu(1922).
Uma
das etimologias sugeridas para o termo é que ele deriva do romeno Nesuferitul,
que significa "o ofensivo" ou "o insuportável".
É o protagonista se refere como Conde Orlok
nessa versão de Nosferatu.
Essa
primeira adaptação do romance de Stoker foi concebida uma década depois que o
autor havia falecido.
E
como a obra estava protegida por direitos autorais, os herdeiros de Stoker
entraram com um processo contra a produtora que deu ganho de causa a família e
por conta disso eles precisam queimarem os registros dessa obra para que não
fossem mais distribuídas.
““Nosferatu”
foi o primeiro e único projeto lançado pela Prana Film, que declarou falência
depois que a viúva de Bram Stoker venceu o processo nos tribunais da Alemanha.
Além de requerer parte do lucro obtido com o filme, Florence também exigiu que
os negativos e todas as cópias do longa fossem destruídos, determinada a apagar
o legado da produção para sempre.
Contudo,
a Prana Film manteve algumas cópias escondidas, e logo após a morte de
Florence, em maio de 1937, “Nosferatu” renasceu das cinzas e voltou a
ser exibido nos Estados Unidos, onde “Drácula” já havia caído em domínio
público.”
Essa
primeira versão cinematográfica de Drácula quase caiu no esquecimento
nas décadas que se seguiram, principalmente quando em 1931, mesma data do
falecimento do cineasta Murnau, a Universal Studios, após conseguir negociar a
compra dos direitos de adaptação da obra de Stoker e contratou para dirigir Tod
Browning(1880-1962), e escalou o húngaro Béla Lugosi(1882-1956) para
protagonizar a mais ilustre figura do Principe Vald III como o
célebre vampiro em Drácula.
Com
o todo estereótipo que o tornou célebre e referência na cultura pop. Com aquele
perfil atraente, sedutor, com capa
preta, se transformando em morcego e com dentes caninos para morder os
pescoços.
Esta celebre adaptação pelas mãos da Universal
foi a grande responsável por revolucionar uma ideia bastante inovadora para a
época que foi a de idealizar os crossovers, os universos compartilhados com
outros monstros como Frankstein, A Múmia dentre outros, que não é
um ineditismo que acompanhamos com os filmes de super-heróis da Marvel durante
os anos 2010.
E
foi sendo replicado ao longo dos anos em que foram outras adaptações de Drácula
ou mesmo fazendo referências em
séries de tv, animações, quadrinhos, até mesmo novela da Globo chamada Vamp(Brasil,
1991-1992), enfim deu para entender. Isso porque passados alguns anos, o livro
de Stoker caiu em domínio público.
Ao
contrário dessa primeira adaptação que foi a versão de Nosferatu de 1922, cuja
primeira caracterização trazia um toque mais grotesco, pavoroso e medonho como
posso descrever que foi concebida para compor o ator Max Shreck(1879-1936) cujo
aspecto da feiura causado pela caracterização o deixou bem assustador.
Uma
caracterização cuja inspiração veio da representação racista com relação ao
povo judeu. Sendo que isso ocorreu bem antes da Alemanha viver os horrores do
nazismo, que levou os judeus ao holocausto.
Digo
isso porque desde que o povo judeu viveu séculos após a diáspora pelo Império
Romano vagando de forma nômade sem território eles eram vistos como um povo
indesejado, que eram vistos como transmissores da peste e eram equivalente aos
ratos, tanto que na HQ Maus do sueco Art Spilgerman ele faz um
representação do judeu como ratos, que inclusive é inspirado na triste história
do seu pai Vladek Spilgerman que foi um dos que estiveram no Holocausto.
Mas
o que isso tem a ver com a caracterização usada nesse Nosferatu?
Simples, o estilo grotesco de orelhas pontuda simboliza o estereótipo
caricato do judeu ambicioso com um nariz adunco, com as orelhas
pontudas e as dentaduras que remetam as dentaduras de ratos que também aparecem
no filme, tudo serviu para compor a primeira caracterização do cinema de Drácula.
Nosferatu representou um marco
importante para a época áurea do movimento artístico expressionista
alemão. Um movimento que se desenvolveu na Alemanha após a Primeira
Guerra Mundial. Caracterizada pela distorção de cenários e personagens, representação
subjetiva do mundo, uso de maquiagem, fotografia e outros recursos para expressar
a visão dos realizadores, ambientação de terror, suspense, ficção científica e
fantasiosa.
O
Expressionismo Alemão foi influenciado pelo Romantismo alemão e pelos sentimentos
de impotência e falta de perspectiva que se seguiram ao fim da Primeira Guerra
Mundial.
E
Murnau bem soube como trabalhar a
estética expressionista no filme usando dos jogos de luzes e sombras que foi
muito trabalhado posteriormente no cinema noir e também e de todo jeito, pode se considerar “Nosferatu”
como o pioneiro na ideia de cultuar a figura vampiresca do Conde Drácula, além
disso, pode-se considerar também que o interprete do Conde Orlok em Nosferatu,
Max Shreck(1879-1936) foi o pioneiro em encarar o Conde Drácula no cinema, mas
de uma forma pouco habitual de caracterização como estamos acostumados a
ver com a capa preta e os dentes caninos.
Um
dos cineastas que mais para frente bebeu
da fonte de Nosferatu para explorar o seu estilo de terror gótico é o Tim
Burton, ainda mais que um dos filmes que
ele dirigiu que foi em Batman-O Retorno(Batman Returns, EUA, 1992) ele
batizou um dos vilões vivido por Christopher Walken de Max Shreck.
Na
posteridade houveram outros cineastas que criaram sua própria versão Drácula
inspirada em Nosferatu como a exemplo do que Robert Eggers fez recentemente.
Exemplos
foi do alemão Werner Herzog em Nosferatu-O Vampiro da Noite(1979), vinte
anos tivemos A Sombra do Vampiro(2000) e fora a versão de Robert Eggers
em 2024 também teve a versão Nosferatu-Uma Sinfonia de Horror.
O
que prova o quanto Nosferatu continua relevante como cinema de terror.
Esse
centenário filme, apesar de não ser muito atraente para as novas gerações por ser em preto e branco e não ter o áudio,
visto que o cinema falado só surgiria com o lançamento do filme O Cantor de
Jazz(1927). Ainda assim, ele é um filme que tem a sua importância,
principalmente para compreender a estética do movimento expressionista alemão.
Tem
disponível no Youtube.
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